domingo, 7 de setembro de 2008

Expedição Rio Caraú



1º dia
Acordei bem cedinho e revisei todo o equipamento antes da chegada de Marcelo. Ainda fui pro mercadinho comprar um botijão de água mineral e uma sandália nova para substituir aquela que acabara de quebrar. Quando Marcelo finalmente chegou guardamos uma canoa por baixo do imbuzeiro e carregamos a outra com toda nossa tralha. É muito importante nessa hora distribuir bem o peso da carga para garantir um bom equilíbrio da embarcação. Às 10:10h zarpamos enfim de Araras em direção SE; estamos intencionados a subir o rio Caraú, afluente do Piranhas, até onde der.
Às 11:15h chegamos a Itatinga, a pedra branca em tupi, um rochedo que domina a região; subimos até o topo e fixamos o waypoint com o gps no marco do DNOCS. De volta à canoa comemos uns biscoitos e às 12:00h voltamos a remar. Após um baixo e amplo rochedo, que proteje umas pequenas baias, entramos na foz do rio Caraú e cruzamos para outro lado com um pouco de vento contrario. Por volta das 13:00h chegamos à ilha das Cabras, assim batizada pela maciça presença do animal. Na verdade se trata de um promontório que durante a enchente fica isolado. Acendemos uma pequena fogueira e preparamos café quente, que tomamos comendo uns sanduíches de patê de peru e tomate fatiado que preparei na hora. Foi nessa ocasião que reparei ter deixado em cima da geladeira a penca de bananas destinadas à expedição... putz! De rolé na ilha, descobrimos dois lugares diferentes ótimos para tomar banho, numa enseada abrigada um e outro aos pés dum rochedo, ambos com fundo de areia.
Às 14:15h saímos da ilha das Cabras e remando por uma hora em direção E, com um leve vento contrario, chegamos num lugar bonito que, após breve exame, se demonstrou apropriado para acampar, armar as redes e fazer fogueira. Batizado o lugar de Campo Alfa, desembarcamos a tralha toda, limpamos a área que iríamos ocupar com nosso rancho e acendemos o fogo entre umas pedras perfeitas para uma cozinha de campo. Caminhando para conhecer mais o lugar, não encontramos que algumas cabras e não avistamos nenhuma casa nas vizinhanças. O Campo Alfa é perfeito para o acampamento, pois dispõe de amplas áreas bem niveladas onde armar as barracas perto do rancho; existem também uns lugares à beira d’água onde tomar banho em total privacidade. Às 18:00h jantamos fígado acebolado na brasa, feijão verde e macarrão; na caneca café quente. Depois deitamos nas redes e ficamos conversando um bocado antes de dormir. Ao longo da noite foi interessante descobrir que no Campo Alfa não tem mosquitos, pernilongos, etc... beleza!

2º dia
Acordei às 5:15h escutando o barulho da lenha sendo quebrada por Marcelo, mas fiquei mais um pouco deitado na rede. Quinze minutos depois o café estava pronto e o aroma dele me acordou definitivamente. Comemos biscoitos e frutas; depois arrumamos toda a tralha e levamos perto da canoa. Deixamos o Campo Alfa melhor de como o encontramos, pois aproveitamos para levar junto com o nosso um pouco de lixo que encontramos espalhado.
Às 7:00h saímos do Campo Alfa bem devagarzinho, eu remando e Marcelo pescando. Num momento um pequeno tucunaré mordeu a isca, mas foi logo devolvido pro rio. Guardado o material de pesca, testamos nossa velocidade com o gps, dando uma carreirinha e marcando 7 km/h.
O céu hoje amanheceu cinza e o vento começou a soprar cedo. Tudo indica que iremos pegar chuva. Remamos com o vento de contra para atravessado até a ponte da RN 118, aonde chegamos por volta das 8:30h. Ao passar por baixo da ponte conferi com o gps a marcação feita com antecedência no Google Earth. Nos dois lados da ponte estão erguidas as casas do povoado que tem o mesmo nome do rio. Duzentos metros à frente encontramos a velha ponte e para continuar a viagem tivemos que fazer uma portagem; à causa da enchente o nível do rio está tão alto que a velha ponte fica quase completamente submergida. Impossível passar por baixo. Em caso como isto se deve retirar da canoa toda a carga pesada e literalmente passar o obstáculo carregando a embarcação. Nos ajudaram dois pescadores locais, que nos acompanharam até o ponto melhor para fazer a portagem e nos auxiliaram durante a operação. Valeu!
Por causa da enchente, o rio Caraú alagou boa parte da região circunstante; às vezes fica até difícil entender onde esteja o leito do rio. Após ter dado duas largas voltas paramos numa enseada lamacenta e subimos até uma simples carvoaria no meio do mato. Ali tirei as ultimas fotografias desta expedição, porque a câmera quebrada, que há alguns dias tinha voltado a funcionar, parou de novo. Na mesma hora começou também a chover. Às 9:40h primeiro veio uma chuva fininha por uma meia hora. Marcelo ficou pescando um pouco nas pedras e eu fui dar uma caminhada por ali. Quando estiou, fizemos um rápido lanche energético (biscoitos, rapadura, castanha de caju, mel e fruta).
Ao sair dali a chuva recomeçou a cair: uma hora rala, outra mais grossa. Fomos subindo o rio devagar, reduzindo a velocidade perto de cada pedra ou rochedo para Marcelo pescar um bom peixe para comer no jantar. De novo ele pegou um peixe pequeno (outro tucunaré) e o devolveu ao rio.
Às 11:00h, por baixo da chuva, paramos no meio do rio para conversar com um pescador que estava jogando tarrafa de cima de uma pequena jangada; ele disse que de ali deveria ter mais uns três ou quatro quilômetros de rio navegável, antes de se transformar num pântano. Assim continuamos subindo o rio... ora na chuva, ora não... Marcelo jogando a isca em todos os cantos interessantes, mas sem sucesso. À beira dessa banda do rio Caraú, da nascente até a ponte velha, os moradores da região aproveitam da enchente para plantar de tudo. As cercas dos terrenos ficam em parte submergidas, merecendo atenção dobrada para evitar colisões indesejadas. Por causa da chuva não nos deparamos com muita presença humana: além dos poucos pescadores, só avistamos uma lavadeira, ajoelhada numa pedra. Ao contrario avistamos muitas aves e pássaros: garças, socós, mergulhões, etc...
Às 12:15, sendo impossível continuar remando, descemos da canoa e avançamos os últimos cinqüenta metros com a água até as canelas, rebocando nossa embarcação, para conferir que realmente não tivesse como continuar adiante do largo pântano. Com o gps marquei a localização exata, observado por um grupo de grandes garças brancas, que estavam esperando esse dia de chuva passar, cada uma em cima de uma estaca de alguma cerca ali.
Voltamos a remar, mas muito lentamente, saboreando um panorama inesperado, mas não menos belo: uma paisagem bonita num dia de chuva! Após uma meia hora a chuva engrossou e assim, já com fome, paramos por baixo de uma mangueira. Tentamos até acender um fogo para fazer o café, mas sem muita sorte, assim comemos nossos sanduíches bebendo água da chuva... eh eh eh !!! (brincadeira...)
Pouco depois deu nova estiada e voltamos a remar. Um pedacinho de céu rasgou mostrando um pouco de azul. Otimista, troquei a camiseta molhada por uma seca. Dez minutos depois começou a descer uma garoa que nos acompanhou até a ponte velha, onde repetimos a portagem no sentido contrario, dessa vez sem a ajuda de ninguém. Passamos por baixo da ponte e fomos dar a volta de um rochedo solitário perto dali para marcar a posição no gps. Rumamos pro Campo Alfa preguiçosos.
De repente a chuva engrossou e o vento cresceu. Caiu um verdadeiro toró e, não podendo fazer nada de melhor, nós continuamos remando. Com um ritmo de 45 remadas por minuto pegamos uma boa velocidade e chegamos ao Campo Alfa perto das 4:00h. Descarregamos rapidamente toda a tralha e viramos a canoa na areia. Aí eu vi que de manhã Marcelo lavou e deixou de molho a grelha na beirinha; ali onde a esquecemos a reencontramos. Com a lona laranja e uns cabos armamos um toldo entre as arvores para criar uma área seca. Depois demoramos um tempão para conseguir acender o fogo.
Botamos no fogo a água para o café e aquela para os legumes e Marcelo ficou vigiando para evitar que o fogo apagasse. Sentado no balde virado à frente de uma pedra definitivamente perfeita como plano de trabalho, descasquei e cortei em cubinhos batata e cenoura para cozê-las como acompanhamento do delicioso picado de fígado acebolado com cominho que preparei. Aproveito da ocasião para explicar que quando fui fazer a feira no mercado não tinha a carne de sol que queria comprar e foi o balconista que me empurrou esse fígado que comemos nesses dias... eh eh eh !!!
Depois do jantar fomos olhar a lua e as estrelas no céu manifestar uma tendência à melhora climática. Conversamos um pouco e depois fomos deitar nas redes. Marcelo dormiu logo, eu fiquei ainda um tempo lendo à luz do lampião.

3º dia
Sem pressa acordamos por volta das 7:00h e tomamos café com frutas e biscoitos. Arrumamos todo o equipamento e carregamos a canoa. Às 9:30h com toda calma zarpamos do Campo Alfa e ficamos por um tempo na área procurando um atracadouro alternativo ao usado nesses dias, onde tem algumas pedras perigosas. Marcelo aproveitou para fazer mais uma tentativa de pesca, mas sem êxito.
Após uma meia hora apontamos a proa para a ilha das Cabras e encostamos nela, mas sem descer. A chuva do dia anterior é só uma lembrança e o céu está bem azul. Pensei em conhecer melhor uma grande enseada conhecida pelos pescadores como “Três Postes”, do lado esquerdo da foz do rio Caraú, mas acabei aceitando a proposta de Marcelo e fomos até a ilha E, que batizamos assim porque o dono da mansão ali construída se chama Edivaldo ou algo parecido. Com o vento a favor chegamos à ilha em menos de quinze minutos. Aportamos numa praia de areia fina e, após ter cumprimentado o caseiro fomos dar um rolé para conhecer o lugar. Registrei as coordenadas da ilha E no gps e fizemos um rápido lanche com biscoitos e frutas.
De novo na canoa fomos dar a volta inteira dessa ilha que parecem três e Marcelo, na ultima tentativa do dia de pescar, estourou a linha e ficou roxo de raiva quando sua isca artificial foi pro fundo para sempre!
Apontamos para a Itatinga e, quando chegamos a quatrocentos metros de distancia, dobramos para esquerda e entramos em outra grande enseada que ainda não conhecia; muitas carnaubeiras e só três casas, uma bem distante da outra.
Sem rumo certo, ficamos encostando aqui e ali, olhando as aves pescadoras voar bem baixinho sobre o espelho d’água e trocando idéias sobre técnicas de remada e acampamento. Sem nem reparar quase, já estávamos beirando a ilha perto de Araras... Mais umas poucas remadas e chegamos em casa.