quarta-feira, 17 de setembro de 2008

Notas de um macaco velho

Jack - Foi tanto o entusiasmo organizando este concurso literário que fiquei empolgado e acabei escrevendo um conto, aliás, ainda estou escrevendo...

Eddy - Olhe...! Você não pode participar deste concurso! Como organizador...

Jack - Já sei, já sei... como na época do torneio de xadrez... só fiquei olhando.

Eddy - Mas você pode publicar seu conto fora do concurso; feito assim... uma coluna literária... sacou?

Jack - Pode crer! Desta gostei... um conto por mês... algo assim; parafraseando Bukowski poderia chama-las, deixa ver... Notas de um macaco velho...

Eddy - Pronto.



UMA NOITE DE CHUVA

O bar estava quase vazio. Era uma quarta feira em meados de maio; tinha acabado de chover e na rua só andava um cachorro molhado; logo que o garçom deu as costas para a entrada, o pulguento foi esconder-se por baixo de um banco de madeira, que estava em um cantinho seco e escuro; perfeito para passar despercebido e longe da chuva. Na mesa redonda, por baixo da luminária de papel colorido que Leon construiu, estavam as irmãs argentinas Celeste e Adelaide, jogando generala aos dados com três outros; uma mulher gorda que soltava uns gritos de euforia quando realizava uma boa pontuação e dois homens, um deles com um sorriso sinistro estampado na cara, que tomava rum com “umas gotinhas de limão”. Mais longe possível do olhar alheio, na mesinha atrás do tronco de coqueiro que sustinha a palhoça naquele canto, trocando beijos incandescentes e aliviando os lábios de tanto calor tomando uma geladinha: um gringo recém-chegado em Pipa e aquela linda criatura morena de olhos verdes que trabalhava na cigarreira do seu Zé do Pé. Os dois tinham acabado de conhecer-se à noite precedente na barraca da baiana, na praia, e estavam agarrados um no outro o tempo inteiro. Quando o sortudo alemão levantou para ir ao banheiro, naquele ritual vai-e-vem de quem toma mais de uma cerveja, passou no meu campo visual e deu para ver no rosto dele a expressão de felizardo que o acontecimento merecia. No meio da sala, por baixo das lâmpadas mais fortes, o Paulista e Lélio estavam jogando xadrez, trocando olhares ferozes na mútua tentativa de aplicar estratégias psicológicas. Atrás do balcão, Eusébio, com eloqüente mímica, descrevia para um italiano de bigodes um golaço de Maradona na época do Nápoles. Xavier e Viola tinham já desmontado a banquinha onde costumavam expor a própria mercadoria; sentados nos bancos no fim do balcão, apesar de estar conversando entre eles, não puderam evitar de olhar para as contidas acrobacias de Eusébio. Eu, de fone de ouvido na cozinha, cuidando da seleção musical, sorria ao ver, através da janelinha que dava na sala, a reação do cachorro ao perceber o cheiro das lingüiças postas na grelha pelo cozinheiro. O focinho do cachorro não conseguia parar, fungando no ar as menores partículas do irresistível cheiro. Pelo resto, o bicho estava imóvel. Até os olhos mantinha fechados.

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Recomeçou a chover e a noite transcorria lentamente. Em um momento entraram dois pescadores nativos, Joca e Damião: sentaram a uma mesa e pediram logo uma cerveja e dois espetinhos de coração. Rubinho, o garçom, perguntou: "Tem preferência pela cerveja?" "Pode trazer a mais gelada, meu irmão" replicou o mais alegre dos dois, Damião, ajeitando-se no banquinho para apoiar-se ao tronco de coqueiro e esticar as pernas. O garçom veio até a cozinha para fazer o pedido e anunciou solene: "Dez e meia da noite... com esta chuva, hoje não vem mais ninguém". Vã esperança dele de ir cedo pra cama, como veremos. O Paulista meteu só a cabeça dentro da cozinha para desafiar-me no xadrez. Botei um vídeo dum show ao vivo de B.B.King para assistir na tv e saí da cozinha. Passando pelo bar, aproveitei para tomar uma cachacinha e esquentar o esqueleto numa noite fria como aquela. O Paulista me viu e quis tomar uma dose também; depois fomos sentar para jogar à mesa estratégica, de onde, pelo particular visual amplo, dava pra manter todo o local sob controle. Tinha acabado de sentar, quando um carro chegou e parou bem em frente à entrada do bar; a porta abriu e um cara desceu rapidamente do carro e foi andando em direção ao balcão. Eusébio, que naquela época achava uma ofensa pessoal se alguém estacionasse na frente do bar, lançou-me um olhar interrogativo, como para dizer: “mas quem é este doido?”, porém não falou nada e ficou fitando o recém-chegado. Este, sem nem sentar, pediu uma dose que tomou num gole, depois perguntou pelo banheiro e foi lá. Quando voltou, sentou num banco ao balcão e ficou estudando o cardápio por um pedaço. "Eu quero... quero... um espaguete à bolonhesa" enfim disse, "pode caprichar que hoje só comi um cachorro-quente na rodoviária de Recife, meu irmão..." "Você disse Recife, mas não tem sotaque de pernambucano..." começou Eusébio. "Pois é, meu irmão; sou carioca... mas moro em Fortaleza" replicou o homem prontamente. "Uma Bolonhesa, bem servida" disse Eusébio na janelinha da cozinha.


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Meio distraído, à mesa de xadrez, acabei perdendo uma torre e um peão em troca de um cavalo; quando chegamos no final, estava em evidente desvantagem, destinado a sucumbir aos ataques adversários. Mas o Paulista também perdeu a concentração e deixou que eu desse um xeque nele, atacando no mesmo tempo o rei e a única torre presente no tabuleiro. Depois ficou um pouco mais fácil e, sacrificando o meu cavalo no ultimo peão dele, a partida terminou empatada. Parou de chover por uns quinze minutos e logo Eusébio aproveitou para pedir ao dono do carro, que tinha já acabado de jantar fazia um tempo, para estacioná-lo um pouco mais prá lá e deixar livre a passagem. "Desculpe, meu irmão... mas já parou de chover e tirando o seu carro fica mais legal, sabe... para o pessoal entrar e sair..." O carioca olhou para Eusébio.como se não tivesse entendido; ficou por uns segundos com uma cara de idiota, depois fez uma careta e levantou do banco agilmente. Com sete longos passos chegou à porta do carro, subiu, ligou o motor e partiu. Assim que o carro saiu, entrou.Virgilio; foi até a mesinha preferida dele e sentou-se. "Tem picanha, che?" perguntou para Eusébio, "dá-me uma cerveja bem gelada" "Naturalmente tem picanha" respondeu este, "argentina, che... puríssima tapa de quadril." "Para um ou para dois?".indagou, para poder passar o pedido à cozinha, e sem esperar a resposta acrescentou, dando a volta ao balcão e ficando mais perto: "Hoje não esperou a meia-noite para fechar a pizzaria". "Também... só rolou chuva" disse Virgilio, e respondendo: "Picanha para um, com bastante batata, pouco arroz... salada sim", e indicando a garrafa: "Toma-te um copo comigo, se não vai ficar quente". Eusébio deu três passos e, na porta da cozinha, anunciou, escandindo as palavras: "Picanha para um, com bastante batata, pra Virgilio... pouco arroz". "Beleza, brother... Picanha para um, no capricho" confirmou o cozinheiro e já estava abrindo a geladeira dando uma meia-volta num pé só. Voltando nos próprios passos, Eusébio deu de cara com Rocco, um barrilete que acabara de chegar e já estava entrando atrás do balcão para surrupiar um refrigerante. Rocco, amigo de Eusébio, estava hospedado em casa de Leon e trazia um recado: "Leon não vai poder vir" disse logo, "está brigando com a maquina da fumaça da boate e, por enquanto, está apanhando..." concluiu. Eusébio sorriu... e eu também, claro.


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Recomeçou a chover. O homem do carro entrou apressado no bar e voltou a sentar-se no mesmo banco onde estava antes. Pediu mais uma caipirinha e caiu de novo na conversa com o italiano de bigode, um tal Franco, que naquela época morava em João Pessoa, mas que estava querendo construir uma casa em Pipa. O show de B.B.King tinha acabado e eu estava de novo trocando discos, mas logo na MTV anunciaram o show de Nirvana acústico e assim comutei naquele canal. Não se tratava de novidade, claro, mas um show desse peso vale a pena ver de novo, como dizem na tv. Paulo e a doida C. desceram correndo a rua da gameleira gritando, abrigando-se da chuva cada um dentro de um grande saco de lixo preto. Logo foram para o balcão onde tomaram uma dose de cachaça dum gole só, “para carburar”. Depois pediram uma cerveja e começaram a conversar. Ironicamente, com a notória eloqüência que o distingue, Paulo começou a falar com Xavier, sentado de um lado, enquanto a doida C., que conhecia o italiano, que sentara do outro lado do balcão, pediu um cigarro para ele e perguntou noticias de não sei quem, dando as costas para o amigo pintor pelo tempo todo, quase. Todavia os dois continuaram tomando da mesma garrafa e quando foi hora de pagar dividiram com equidade.


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Era quase uma hora da manha quando a chuva interrompeu de novo; muitos aproveitaram para ir embora. Virgilio levantou-se, como se tivesse lembrado alguma coisa importante, e disse: "Vamo-nos, Enano... hasta mi casa..." Eusébio chamou a minha atenção com um olhar significativo. Quando fomos mais perto, ele comunicou: "Vou até a casa de Virgilio. Se não quedo dormindo na frente da tv, volto de aqui a pouco". "Beleza!", repliquei lacônico, dirigindo-me para a pia do balcão, onde estavam um bocadinho de copos para lavar. Eusébio pegou dois cigarros de uma carteira aberta, que sempre ficava na gaveta do caixa, e foi embora com o chileno. Rocco foi atrás deles, segurando na mão um chori-pan, saboroso sanduíche com lingüiças na grelha e chimichurri, molho picante. O cachorro acordou e foi atrás de Rocco, ou, mais propriamente, do cheiro da lingüiça, na esperança de ganhar um pedaço... pelo menos do pão. A turma dos dados pediu a conta, pagou e foi embora com medo que recomeçasse a chover. Um dos pescadores levantou da mesa, veio até o balcão, pediu a conta, o desconto, pagou e foi embora. O amigo, já pronto para a cama, segui-o como uma sombra. Apaguei a metade das luminárias da sala e o garçom começou a arrumar tudo para fechar. O som ficou bem baixinho para acompanhar este final de expediente. Xavier e a mulher despediram-se e foram embora. Paulo pegou carona com eles e foi-se também. A esta altura da madrugada apareceu Leon. Tentando consertar o aparelho tinha fumado todos os cigarros; à procura de cigarro mesmo foi que ele caminhou até o bar naquela hora. Logo foi para a cozinha buscar um maço novo. A doida C. foi atrás dele, falando qualquer coisa. O carioca pediu a conta, mas na hora de puxar o dinheiro do bolso lembrou de ter deixado a carteira no carro. Levantou do banquinho com um salto e disse: "Volto já." e saiu de novo quase correndo. O italiano bocejou duas vezes, estirando os braços para cima; sacou duas notas de dez do bolso e colocou por baixo do copo vazio no balcão. "O resto fica de credito para a próxima vez" disse, e já se encaminhando: "Boa-noite". Fazendo zapping na tv, Leon encontrou "Blade runner" que estava para começar na sessão corujão. O cozinheiro mexeu um pouco na brasa para reavivá-la e colocou uns bifes para assar, para todo mundo comer alguma coisa antes de ir embora. A menina da cigarreira e o alemão também pediram a conta e abraçados foram embora. O cozinheiro ficou para a ceia. O garçom desligou todas as luzes e deixou acesa só aquela do balcão; enfim foi embora, carregando o saco do lixo até a esquina. Ficamos assistindo ao filme até quase amanhecer. Ainda apareceu o barrilete Rocco, que sentou conosco e comeu um pedaço de carne dura e fria que tinha sobrado... O homem do carro, que foi buscar a carteira para pagar a conta, não voltou àquela noite nem nunca mais. Mas... se ele vacilar e aparecer de novo na Pipa... tenho certeza que Eusébio, que é fisionomista, ainda reconhece-o. Pode crer.

Publiquei este conto pela primeira vez em 2004 no web site www.eca13.org em ocasião do 1º Concurso Literário "Memórias de Pipa", ao qual, como organizador, não pude participar.

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sábado, 13 de setembro de 2008

A tradição não morre



Uma pequena introdução: a cyber-shot que comprei no janeiro passado já no junho, durante a reforma da casa à beira-rio, deu pau e ficou parada por um tempo. Não foi culpa da Sony; é que foi também a primeira câmera fotográfica de minha filha Marina Luna, que adorou ingressar nesse mundo mágico!
Liguei pra assistência técnica em Natal e me disseram que ia demorar muito pra consertá-la na garantia; a lista está grande! Pensei em enviar pro Recife ou pro RJ, como me aconselhou Tito, mas enfim decidi simplificar as coisas: comprei no MercadoLivre na web outra cyber-shot igualzinha, só na cor prata no lugar que preta, por 299 reais, usada.
Pena que o sedex foi extraviado ao chegar em Natal... putz!!!
Agora o amigo vendedor está correndo atrás do sedex perdido e eu fiquei de novo precisando de uma máquina fotográfica! Coloquei a "velha" cyber-shot, num momento de desespero, em cima dum potinho contendo sal grosso e alguns "olhos gregos"... e inexplicavelmente recomeçou a funcionar !!! ...acreditem se quiser! ...só por poucos dias, de qualquer jeito. Durante a expedição IGARUANA no rio Caraú, quando pressentiu que ia começar a chover, a câmera deu pau de novo.
Senti muito a falta de uma câmera fotográfica durante estas últimas semanas cheias de acontecimentos e lugares diferentes.
Pois é... esperando possuir fisicamente de novo uma máquina fotográfica, logo que voltei na Pipa aceitei a proposta de Paolo e ontem peguei emprestada a câmera dele por uns dias. Voltando pra casa vi na praia um grupo de pescadores que estavam trabalhando por baixo de um toldo improvisado com a vela do barco posto em seco: tinham já tirado toda a tinta das obras vivas do casco e o estavam calafetando.
Reconheci Tio Paulo, "Bacia" e Régio, o proprietário do barco, e decidi testar logo a câmera de Paolo. Sem expansão de memória, só deu para tirar 42 fotografias. Passei o material bruto para Negusa Negasta que realizou o vídeo publicado no YouTube.

domingo, 7 de setembro de 2008

Expedição Rio Caraú



1º dia
Acordei bem cedinho e revisei todo o equipamento antes da chegada de Marcelo. Ainda fui pro mercadinho comprar um botijão de água mineral e uma sandália nova para substituir aquela que acabara de quebrar. Quando Marcelo finalmente chegou guardamos uma canoa por baixo do imbuzeiro e carregamos a outra com toda nossa tralha. É muito importante nessa hora distribuir bem o peso da carga para garantir um bom equilíbrio da embarcação. Às 10:10h zarpamos enfim de Araras em direção SE; estamos intencionados a subir o rio Caraú, afluente do Piranhas, até onde der.
Às 11:15h chegamos a Itatinga, a pedra branca em tupi, um rochedo que domina a região; subimos até o topo e fixamos o waypoint com o gps no marco do DNOCS. De volta à canoa comemos uns biscoitos e às 12:00h voltamos a remar. Após um baixo e amplo rochedo, que proteje umas pequenas baias, entramos na foz do rio Caraú e cruzamos para outro lado com um pouco de vento contrario. Por volta das 13:00h chegamos à ilha das Cabras, assim batizada pela maciça presença do animal. Na verdade se trata de um promontório que durante a enchente fica isolado. Acendemos uma pequena fogueira e preparamos café quente, que tomamos comendo uns sanduíches de patê de peru e tomate fatiado que preparei na hora. Foi nessa ocasião que reparei ter deixado em cima da geladeira a penca de bananas destinadas à expedição... putz! De rolé na ilha, descobrimos dois lugares diferentes ótimos para tomar banho, numa enseada abrigada um e outro aos pés dum rochedo, ambos com fundo de areia.
Às 14:15h saímos da ilha das Cabras e remando por uma hora em direção E, com um leve vento contrario, chegamos num lugar bonito que, após breve exame, se demonstrou apropriado para acampar, armar as redes e fazer fogueira. Batizado o lugar de Campo Alfa, desembarcamos a tralha toda, limpamos a área que iríamos ocupar com nosso rancho e acendemos o fogo entre umas pedras perfeitas para uma cozinha de campo. Caminhando para conhecer mais o lugar, não encontramos que algumas cabras e não avistamos nenhuma casa nas vizinhanças. O Campo Alfa é perfeito para o acampamento, pois dispõe de amplas áreas bem niveladas onde armar as barracas perto do rancho; existem também uns lugares à beira d’água onde tomar banho em total privacidade. Às 18:00h jantamos fígado acebolado na brasa, feijão verde e macarrão; na caneca café quente. Depois deitamos nas redes e ficamos conversando um bocado antes de dormir. Ao longo da noite foi interessante descobrir que no Campo Alfa não tem mosquitos, pernilongos, etc... beleza!

2º dia
Acordei às 5:15h escutando o barulho da lenha sendo quebrada por Marcelo, mas fiquei mais um pouco deitado na rede. Quinze minutos depois o café estava pronto e o aroma dele me acordou definitivamente. Comemos biscoitos e frutas; depois arrumamos toda a tralha e levamos perto da canoa. Deixamos o Campo Alfa melhor de como o encontramos, pois aproveitamos para levar junto com o nosso um pouco de lixo que encontramos espalhado.
Às 7:00h saímos do Campo Alfa bem devagarzinho, eu remando e Marcelo pescando. Num momento um pequeno tucunaré mordeu a isca, mas foi logo devolvido pro rio. Guardado o material de pesca, testamos nossa velocidade com o gps, dando uma carreirinha e marcando 7 km/h.
O céu hoje amanheceu cinza e o vento começou a soprar cedo. Tudo indica que iremos pegar chuva. Remamos com o vento de contra para atravessado até a ponte da RN 118, aonde chegamos por volta das 8:30h. Ao passar por baixo da ponte conferi com o gps a marcação feita com antecedência no Google Earth. Nos dois lados da ponte estão erguidas as casas do povoado que tem o mesmo nome do rio. Duzentos metros à frente encontramos a velha ponte e para continuar a viagem tivemos que fazer uma portagem; à causa da enchente o nível do rio está tão alto que a velha ponte fica quase completamente submergida. Impossível passar por baixo. Em caso como isto se deve retirar da canoa toda a carga pesada e literalmente passar o obstáculo carregando a embarcação. Nos ajudaram dois pescadores locais, que nos acompanharam até o ponto melhor para fazer a portagem e nos auxiliaram durante a operação. Valeu!
Por causa da enchente, o rio Caraú alagou boa parte da região circunstante; às vezes fica até difícil entender onde esteja o leito do rio. Após ter dado duas largas voltas paramos numa enseada lamacenta e subimos até uma simples carvoaria no meio do mato. Ali tirei as ultimas fotografias desta expedição, porque a câmera quebrada, que há alguns dias tinha voltado a funcionar, parou de novo. Na mesma hora começou também a chover. Às 9:40h primeiro veio uma chuva fininha por uma meia hora. Marcelo ficou pescando um pouco nas pedras e eu fui dar uma caminhada por ali. Quando estiou, fizemos um rápido lanche energético (biscoitos, rapadura, castanha de caju, mel e fruta).
Ao sair dali a chuva recomeçou a cair: uma hora rala, outra mais grossa. Fomos subindo o rio devagar, reduzindo a velocidade perto de cada pedra ou rochedo para Marcelo pescar um bom peixe para comer no jantar. De novo ele pegou um peixe pequeno (outro tucunaré) e o devolveu ao rio.
Às 11:00h, por baixo da chuva, paramos no meio do rio para conversar com um pescador que estava jogando tarrafa de cima de uma pequena jangada; ele disse que de ali deveria ter mais uns três ou quatro quilômetros de rio navegável, antes de se transformar num pântano. Assim continuamos subindo o rio... ora na chuva, ora não... Marcelo jogando a isca em todos os cantos interessantes, mas sem sucesso. À beira dessa banda do rio Caraú, da nascente até a ponte velha, os moradores da região aproveitam da enchente para plantar de tudo. As cercas dos terrenos ficam em parte submergidas, merecendo atenção dobrada para evitar colisões indesejadas. Por causa da chuva não nos deparamos com muita presença humana: além dos poucos pescadores, só avistamos uma lavadeira, ajoelhada numa pedra. Ao contrario avistamos muitas aves e pássaros: garças, socós, mergulhões, etc...
Às 12:15, sendo impossível continuar remando, descemos da canoa e avançamos os últimos cinqüenta metros com a água até as canelas, rebocando nossa embarcação, para conferir que realmente não tivesse como continuar adiante do largo pântano. Com o gps marquei a localização exata, observado por um grupo de grandes garças brancas, que estavam esperando esse dia de chuva passar, cada uma em cima de uma estaca de alguma cerca ali.
Voltamos a remar, mas muito lentamente, saboreando um panorama inesperado, mas não menos belo: uma paisagem bonita num dia de chuva! Após uma meia hora a chuva engrossou e assim, já com fome, paramos por baixo de uma mangueira. Tentamos até acender um fogo para fazer o café, mas sem muita sorte, assim comemos nossos sanduíches bebendo água da chuva... eh eh eh !!! (brincadeira...)
Pouco depois deu nova estiada e voltamos a remar. Um pedacinho de céu rasgou mostrando um pouco de azul. Otimista, troquei a camiseta molhada por uma seca. Dez minutos depois começou a descer uma garoa que nos acompanhou até a ponte velha, onde repetimos a portagem no sentido contrario, dessa vez sem a ajuda de ninguém. Passamos por baixo da ponte e fomos dar a volta de um rochedo solitário perto dali para marcar a posição no gps. Rumamos pro Campo Alfa preguiçosos.
De repente a chuva engrossou e o vento cresceu. Caiu um verdadeiro toró e, não podendo fazer nada de melhor, nós continuamos remando. Com um ritmo de 45 remadas por minuto pegamos uma boa velocidade e chegamos ao Campo Alfa perto das 4:00h. Descarregamos rapidamente toda a tralha e viramos a canoa na areia. Aí eu vi que de manhã Marcelo lavou e deixou de molho a grelha na beirinha; ali onde a esquecemos a reencontramos. Com a lona laranja e uns cabos armamos um toldo entre as arvores para criar uma área seca. Depois demoramos um tempão para conseguir acender o fogo.
Botamos no fogo a água para o café e aquela para os legumes e Marcelo ficou vigiando para evitar que o fogo apagasse. Sentado no balde virado à frente de uma pedra definitivamente perfeita como plano de trabalho, descasquei e cortei em cubinhos batata e cenoura para cozê-las como acompanhamento do delicioso picado de fígado acebolado com cominho que preparei. Aproveito da ocasião para explicar que quando fui fazer a feira no mercado não tinha a carne de sol que queria comprar e foi o balconista que me empurrou esse fígado que comemos nesses dias... eh eh eh !!!
Depois do jantar fomos olhar a lua e as estrelas no céu manifestar uma tendência à melhora climática. Conversamos um pouco e depois fomos deitar nas redes. Marcelo dormiu logo, eu fiquei ainda um tempo lendo à luz do lampião.

3º dia
Sem pressa acordamos por volta das 7:00h e tomamos café com frutas e biscoitos. Arrumamos todo o equipamento e carregamos a canoa. Às 9:30h com toda calma zarpamos do Campo Alfa e ficamos por um tempo na área procurando um atracadouro alternativo ao usado nesses dias, onde tem algumas pedras perigosas. Marcelo aproveitou para fazer mais uma tentativa de pesca, mas sem êxito.
Após uma meia hora apontamos a proa para a ilha das Cabras e encostamos nela, mas sem descer. A chuva do dia anterior é só uma lembrança e o céu está bem azul. Pensei em conhecer melhor uma grande enseada conhecida pelos pescadores como “Três Postes”, do lado esquerdo da foz do rio Caraú, mas acabei aceitando a proposta de Marcelo e fomos até a ilha E, que batizamos assim porque o dono da mansão ali construída se chama Edivaldo ou algo parecido. Com o vento a favor chegamos à ilha em menos de quinze minutos. Aportamos numa praia de areia fina e, após ter cumprimentado o caseiro fomos dar um rolé para conhecer o lugar. Registrei as coordenadas da ilha E no gps e fizemos um rápido lanche com biscoitos e frutas.
De novo na canoa fomos dar a volta inteira dessa ilha que parecem três e Marcelo, na ultima tentativa do dia de pescar, estourou a linha e ficou roxo de raiva quando sua isca artificial foi pro fundo para sempre!
Apontamos para a Itatinga e, quando chegamos a quatrocentos metros de distancia, dobramos para esquerda e entramos em outra grande enseada que ainda não conhecia; muitas carnaubeiras e só três casas, uma bem distante da outra.
Sem rumo certo, ficamos encostando aqui e ali, olhando as aves pescadoras voar bem baixinho sobre o espelho d’água e trocando idéias sobre técnicas de remada e acampamento. Sem nem reparar quase, já estávamos beirando a ilha perto de Araras... Mais umas poucas remadas e chegamos em casa.

segunda-feira, 1 de setembro de 2008

Radical evolution: o fúturo é agora!

Não é fácil encontrar um escritor que nos conte da maior mudança dos últimos dez mil anos. Radical evolution é uma visão sugestiva da dramática aceleração das modificações que estão transformando a natureza humana.
Neste livro tem soldados que não dormem e animais controlados por joystick, computadores geridos pelo pensamento e pais que constroem os próprios filhos. Os superpoderes dos heróis dos gibis já existem ou estão sendo desenvolvidos em hospitais, laboratórios ou centros de pesquisas agora mesmo. Enquanto você está lendo estas linhas a evolução humana está numa fase aceleradissima!
Nada de tanto estranho para quem já leu a SF contemporânea, William Gibson, Bruce Sterling e outros, mas a sensação que predomina é assustadora: porque tudo está acontecendo tão rapidamente?
Graças aos progressos das tecnologias GRIN, um acrônimo que está para Genética, Robótica, Informática e Nanotecnologias, estamos modificando a nossa mente, a nossa memória, o nosso metabolismo, a nossa personalidade, as gerações futuras. Joel Garreau nos acompanha junto com os mais importantes pesquisadores e pioneiros da atualidade à descoberta de todos os “melhoramentos” que vão fazer parte da nossa vida quotidiana no arco dos próximos dez anos. E sobretudo, para onde irão nos levar...
No Paraíso, como acham alguns, onde a promessa de tecnologia é a resposta às nossas preces? Ou, como acham outros, no Inferno, onde a corrida desenfreada do progresso comportará a destruição da nossa espécie? Ou numa síntese vitoriosa, na qual a criatividade humana saberá corrigir em positivo todos os bug de sistema? Garreau quer que todos percebamos quanto a tecnologia está avançando mais rapidamente que nossas capacidades de adaptação, e com a ajuda e a capacidade critica dos pensadores e cientistas que estão realizando hoje o que apenas ontem parecia impensável, ele indaga como estes progressos influenciarão cada coisa, do jeito de trabalhar ao jeito de pensar e agir... tudo!
E isso está já acontecendo agora, não vai suceder nos próximos 50 anos!
O fúturo é agora!

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Joel Garreau é um futurólogo, estudioso da cultura, dos valores e das mudanças; autor de Edge City: Life on the New Frontier e de The Nine Nations of North America, é colunista do Washington Post e membro da organização de cenario-planning Global Business Network, além de pesquisador universitário em Berkeley, CA.
Acesse o web site dele: www.garreau.com.